terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Sapatadas na Consciência


Segue a última postagem textual de meu blog em 2008, em tom de retrospectiva política pontuada pelo convite aos Paradigmas da Esperança.
(Grito Pacífico, mudando o mundo com você)

SAPATADAS NA CONSCIÊNCIA

Olho para a Europa e vejo o passado. Olho para a América Latina e vejo o futuro. Os ventos estão soprando a favor de países emergentes como o Brasil. A brisa progressista da mudança está convidando nosso povo a sentir mais orgulho de si mesmo e de seu país. Esse sentimento, no meu olhar jovial da história, foi antecedido por três estágios.

A década de 80 vibrou com a transição democrática que abateu o monstro repressivo da ditadura. A chamada Constituição Cidadã de 1988 foi o estopim da vontade de reconstruirmos uma nação mais livre, madura e plural, disposta a reconhecer legalmente lutas históricas encampadas pela sociedade civil organizada e seus movimentos sociais. Eu tinha apenas 8 anos quando isso aconteceu. Tais luzes pareciam anunciar uma nova era.

Infelizmente, o fardo elitista de arrogância continuou infiltrado na política brasileira, cujas engrenagens do poder não se mostraram em nada simpáticas aos anseios populares expressos em reivindicações ligadas a reforma agrária, educação pública e democratização da mídia. Um sociólogo ideologicamente de araque, em oito anos de conservadorismo burguês, deixou tristes marcas: privatizou nossas esperanças, aprofundou nossas desigualdades e retardou nosso desenvolvimento. O desgoverno desse ex-presidente foi ótimo para as multinacionais estrangeiras, mas péssimo para muitas empresas domésticas.

Em 2002, uma espécie de “Barack Obama brasileiro”, forjado nas lides sindicais, foi eleito por uma multidão desiludida com os rumos da pátria. Mesmo sem erudição intelectual (tão sofisticada quanto inútil), suficientemente espontâneo e seguro a ponto de dar declarações informais a exemplo do “sifú” (para a alegria estúpida dos guardiões do vernáculo polido), buscou recuperar um pouco da auto-estima coletiva, do respeito internacional, da dignidade social, da prosperidade econômica e da memória histórica de nosso país. Não é à toa que sua popularidade atingiu, bem recentemente, recordes olímpicos de aprovação.

Claro que há defeitos e os principais deles, na minha visão pessoal, residem no excesso de paciência frente aos interesses bancários, às manipulações midiáticas e às conivências judiciárias que, respectivamente, oprimem nossas finanças, deturpam nossa comunicação e anulam nossa justiça. São embates que precisariam ser travados.

A boa notícia é que, nos últimos tempos, após rasgar as mordaças costuradas pela mídia oficial, venho tentando pensar com meus botões e me manifestar sem censura pelas vias da blogosfera. Ou seja, naquela época de 88, a rede Globo podia nos fazer de bobo, muito mais facilmente. Agora, levando-se em conta as benesses da globalização consubstanciadas na difusão da internet, podemos buscar - e até veicular - a informação que queremos.

Pois bem, o Brasil vive um momento ímpar em sua trajetória, pois temos a oportunidade, como dizia Mahatma Ghandi, de ser a mudança que queremos ver no mundo. Eu não tenho a menor dúvida do primeiro passo que devemos empreender, mas antes de revelá-lo cabe um alerta: é preciso deixar as picuinhas academicistas de lado e resistir aos debates marxistas, freudianos ou nietzscheanos das estéreis mesas de bar.

Nossa missão nunca foi tão clara e decisiva para o destino sustentável de nossas vidas: precisamos terminar de enterrar o atentado mais terrorista que já se institucionalizou em nossa civilização (pelo menos dentro da minha idade de quase 29 anos). Esse atentado à vida, ao amor, à justiça, à liberdade, à paz, atende pelo desgraçado nome de neoliberalismo. Aposto que se você tiver a idéia de apelidar seu cachorro, seu papagaio, seu hamster, com este maldito nome, “si-fú...”, pobres animaizinhos, eles se matariam de tanto desgosto.

Tampouco será alguém lá de cima do nosso continente, mesmo que seja afro-descendente e banque a pose de super-herói hollywoodiano, que nos salvará sozinho de qualquer catástrofe. Ademais, as peças do tabuleiro geopolítico andam meio deslocadas. Os EUA, juntamente com seus amigos europeus e seu colega japonês, estão colhendo o que plantaram. O protagonismo mundial rumo à transição para outro paradigma, portador de um novo modelo político-econômico, irmanado com os desafios sócio-ambientais do século XXI, está agora na mão dos países emergentes: Brasil, Índia, Rússia e, sobretudo, China.

Convém acrescentar que essa opção, ao ser abraçada sem vacilação, envolve dimensões altamente profundas, que vão desde o revigoramento crítico de linguagens culturais e artísticas como a música, a literatura e o cinema até a ressignificação holística e ecumênica dos valores espirituais e filosóficos que dão sentido à existência, passando radicalmente pela humanização e reintegração sistêmica dos saberes científicos e práticas institucionais que fundamentam a formação intelectual e condicionam a atuação profissional.

Conceitos como lucro, individualismo e competição precisam ser urgentemente revistos, antes que a natureza exploda e a humanidade vire pó. É um absurdo abominável aceitarmos que salários de mega-especuladores financeiros superem com folga o PIB conjunto de pequenos países africanos. Meu Deus, quando seremos verdadeiramente humanos?

Vocês já imaginaram em quantas vezes os faturamentos da indústria armamentista superam os investimentos da política alimentícia??? Não queiram saber, pois senão vocês teriam todo o direito de jogar mil sapatadas em nossa consciência, até o glorioso dia em que a gente acordar da anestesia social e se negar a deixar alguém agonizar fora de um lar.

2 comentários:

Priscilla Viégas disse...

adorei o coteúdo do blog. maravilhoso 2009 amigo!

PABLO ROBLES disse...

Uma colega deixou seu comentário por e-mail, que reproduzo aqui:

"Boa tarde Pablo,
Gostaria de deixar registrado que suas palavras mexeram muito comigo. Concordo com a sua exposição descrita abaixo e também luto e tenho esperança de que iremos construir um novo mundo, talvez ele esteja bem próximo, já que grandes mudanças tem ocorrido nesses últimos anos.
Abs e feliz ano novo!"

(amiga, feliz ano novo também!)