domingo, 28 de fevereiro de 2010

OPINANDO: Por uma oposição menos "suja"

Exponho abaixo o comentário que fiz sobre o texto "Por que Serra deverá concorrer", redigido e postado por Eduardo Guimarães, nos primeiros minutos do dia 28/02/2010, no seu blog http://edu.guim.blog.uol.com.br, que por sinal lhes recomendo.

A tese sobre a qual me posiciono refere-se ao entendimento de que a oposição precisa do Serra para continuar existindo e que todo governo de situação precisa de uma oposição atuante que o fiscalize.


"Tendo a discordar em parte com o teor de sua reflexão.

Oposição política é saudável e sempre necessária, mas ela deve ser mais qualificada; em outras palavras, jogar menos sujo.

O estilo Serra e a postura de sua mídia, que também é a mídia que pauta grandemente a opinião média do brasileiro, não ajudam em nada a garantir e fazer valer uma oposição digna, à altura da democracia política que merecemos.

Além disso, o "controle político" não se resume apenas à intervenção partidária. Em uma perspectiva pública e coletiva mais ampla, a sociedade civil como um todo, através de suas associações, movimentos e grupos organizados, deve participar ativamente, mesmo que indiretamente, da fiscalização do poder executivo, de forma a evitar desmandos e inibir totalitarismos."

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

HAITI: a pátria circunstancial dos EUA

"O compromisso com o Haiti não é novo nem circunstancial", disse recentemente o governo brasileiro em uma nota na qual informa que essa é a terceira vez que Lula viaja ao país, o qual já visitou em agosto de 2004 e em maio de 2008, o que "confirma a prioridade conferida ao Haiti pela política externa brasileira".

Fui um pouco “oportunista”, pois decidi começar esta crônica com um parágrafo ao qual eu nunca fui explicitamente chamado, retirado a propósito desta notícia ("Lula chega ao Haiti para expressar apoio e assinar acordos"), que acabei de ler no Portal Ig. Aproveitando meu momento “cafajeste”, cometerei um novo “pecado”, se bem que atenuado o suficiente para ser logo perdoado, pois a nova referência que evoco consiste em uma outra crônica minha sobre o mesmo assunto: "Militarizando o desserviço ao Haiti".

Façamos agora um exercício hipotético de turismo patriótico. Imagine-se acordando brasileiro, no transcorrer do dia se tornando norte-americano para depois dormir haitiano. É possível assumir nacionalidades diferentes como quem muda de roupa? Até as máscaras bonitinhas que camuflam nossas eventuais intenções mesquinhas precisam de um tempo mínimo para decantarem, se ajustarem e se acostumarem com os padrões dominantes de hipocrisia que se prestam a dissimular.

Vamos dar um zoom na frase primeira e central que motivou esse texto: “o compromisso com o Haiti não é novo vem circunstancial”. Em outras palavras, o Brasil não tem essa mania cinematográfica (hollyudiana mesma, literalmente falando, e belicamente também) de se arvorar na condição pop de superpaís, de superpotência aventureira que sai distribuindo bases militares mundo afora a pretexto, por exemplo, de proteger e vigiar os mares alheios contra monstros terroristas e ocasionalmente atômicos que ameacem perturbar as fronteiras “modernamente democráticas” dos países aliados; como Israel no Oriente Médio e Colômbia na América Latina.

Como todo super-herói tem poderes extraordinários e se acha imbuído de missões as mais diversas - ainda que novas e circunstanciais, frise-se bem -, os EUA nunca mais seriam os mesmos se não tivessem estendido seus tapetes altruístas e caridosos para o Haiti, duramente vitimado por um terremoto cujos impactos parecem ter sacudido espiritualmente o coração de toda a diplomacia norte-americana. (Vale acrescentar que essa triste sina do Haiti, como o escritor Eduardo Galeano relembrou, remonta às políticas sujas e invasivas que os mesmos EUA já aprontaram.)

Pois bem, a reação dos EUA foi olímpica, peremptória, esplendorosa, digna do Oscar do Oportunismo, sequer se lembrando de dialogar com a ONU e planejar melhor as coisas com a missão brasileira que já vinha liderando as operações por lá: instituíram um fundo Clinton-Bush (usando o nome indigesto do Bush) para arrecadar donativos, se apossaram do espaço aéreo para controlar do jeito deles a ajuda estrangeira e, o que foi efetivamente controverso, mandaram 12.000 soldados para “passear” no Haiti, como se o povo nativo fosse apático e não tivesse braços para acolher os feridos e pernas para avançar no enfrentamento de seus dramas, contando necessariamente com o suporte já estabelecido (e que passaria por emergencial ampliação) de vários organismos e serviços humanitários, incluindo relevantes ações cubanas de saúde.

Essa é a lição de ética (geralmente pelo avesso) que aprendemos com os EUA. Surge (ou fabrica-se) uma propagação de epidemia (como a gripe suína), suas indústrias de remédio são as primeiras a “ajudar” e lucrar. Quando sentem cheiro de petróleo no ar, rasgam soberanias de países frágeis para com novos negócios “cooperar” e lucrar. Quando algum presidente não lhes diz amém e ousam remar na maré oposta ao neo-liberalismo, dão uma aula-show de anti-jornalismo, visando “desinformar” e lucrar.

Portanto, em vez de terem mobilizado um “exército verde” de ambientalistas sérios e competentemente autorizados a evitar o fracasso da Conferência do Clima ocorrida ano passado em Copenhage, na Dinamarca; os EUA valeram-se da “sorte geopolítica” trazida pela fúria da natureza contra o Haiti, e, da noite para o dia, metamorfosearam-se (como se iluminados provisoriamente por um mandato divino imperial) em seus superanjos salvadores, carregando nessa travessia pseudocivilizatória as asas manchadas sabe-se lá com quantos interesses inconfessáveis, diabólicos.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

OPINANDO: o povo não é tão bobo

Li o texto linkado abaixo, da autoria do jornalista e blogueiro Azenha.

http://www.viomundo.com.br/opiniao/jose-serra-o-presidente-acidental

Reproduzo, aqui, o comentário que fiz lá no blog dele:


"Acho o texto pessimista e exponho três considerações:

1) Mesmo as pessoas despolitizadas são capazes de pensar um pouquinho antes de votar, nem que seja numa roda de bar entre amigos na véspera da eleição, onde é muito fácil qualquer pessoa minimamente informada mostrar o abismo que separa a Dilma de Lula do Serra de FHC

2) A aparente despolitização não sinaliza necessariamente uma fraqueza política capaz de ameaçar a estabilidade do país. Pode significar também que as pessoas estão economicamente menos aflitas, mais preocupadas competitivamente com suas carreiras e mais confiantes nos rumos gerais que o Brasil está tomando, inclusive mundo afora.

3) Marqueteiros, por mais influentes que sejam, não podem fazer mágicas o tempo todo e lutar contra o “marketing” diário e cotidiano feito pela inquestionável realidade."

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

A Política da Esperança Não Será Televisionada

A Política da Esperança Não Será Televisionada

É difícil viver sorrindo em um mundo estampado de tristezas, tragédias e mentiras. Abrimos a televisão e o que vemos e ouvimos, não poucas vezes, é puro lixo, da pior espécie, pois além de não poder ser reciclado em informação nem conhecimento, contamina e apodrece a consciência; a sua, a minha, a nossa consciência – um tanto quanto inconsciente.

Concluímos que não dá para continuar com a bunda anexada ao sofá, assistindo de camarote os absurdos disparados dia após dia pela mídia, enquanto o mundo vai adoecendo, estremecendo e afundando, de omissão em omissão. Quantas drogas são necessárias para se ignorar o drama da realidade? Quantos vícios precisam ser fabricados ou reeditados para que nossos sentidos mantenham-se imunes e indiferentes aos problemas dos outros?

Pessimismos e descalabros à parte, é proibido esquecer que a magia da esperança dança, feito criança pura, em todo lugar do mundo, em cada ternura da gente, nas epopéias e agruras dos povos, apesar dos tropeços e recomeços de suas revoluções, ideologias, instituições e nações. Sem esperança, o amor não tem cura e a paz nunca dura.

Não deixem que a sensação de fracasso e a epidemia da perdição escureçam seus passos, suas luzes, seus impulsos regeneradores de rebeldia e ousadia, sua vocação humanitária, seus ideais de melhoria embalados pela dança da mudança, aquela que jamais se cansa de avançar, de ensinar e de nos convidar a encarnar suas coreografias.

Para que novos valores, paradigmas e civilizações floresçam, urge que reciclemos nossos olhares, revisemos nossas decisões e repensemos nossas atitudes, antes que até a esperança desista da humanidade – ou pelo menos do pouco dela que conseguimos reter no decurso de nossas indevassáveis monstruosidades. Ninguém pode se dar ao luxo de nascer e conviver em sociedade para não fazer nada pelo bem-estar da coletividade.

Sem os políticos que dizem (retoricamente ou não) nos representar, o cotidiano seria refém do caos e as relações se rebaixariam a uma disputa infinita e incontrolável de interesses. No entanto, sem a devida participação ativa dos cidadãos comuns na formulação, acompanhamento e fiscalização de suas próprias demandas e aspirações coletivas, a população civil não passaria de uma massa servil, amorfa, desprovida de consistência crítica e substância autônoma.

Esse é o tipo de “povo” que as TVs, em geral, buscam forjar: um povo bobo, tangido pelo medo, identificado globalmente pela negligência local. E o grande problema é que essa mídia tradicional, conservadora, parcial, elitista, sensacionalista, entreguista – dogmaticamente privada e sutilmente golpista – busca nos governar (ou “desgovernar”) a qualquer custo, filtrando e transmitindo apenas o que lhes convém e deformando o resto.

Não basta simplesmente entrar no ringue das baixarias e competir com a oposição quem tem mais “denúncias na manga”, quem fede e vacila menos, quem sai menos mascarado na foto, quem reúne mais pontos em sua biografia. Chega de dejetos. O Brasil precisa é de projetos que levem seus moradores a patamares ainda mais sólidos de inclusão social, cuidado ambiental, equidade econômica, democracia científica e grandeza ética.

sábado, 6 de fevereiro de 2010

POESIA: Procura-se simplesmente evoluir

PROCURA-SE SIMPLESMENTE EVOLUIR

Procura-se sorrir, apesar das lágrimas que sufocam as alegrias
Procura-se viver, apesar dos vícios que roubam nossas energias

Procura-se sentir, apesar das indiferenças que povoam os sentidos
Procura-se gozar, apesar dos pudores que reprimem nossas libidos

Procura-se se achar, apesar dos labirintos impostos pelo mundo
Procura-se arriscar, apesar dos medos que nos vigiam lá no fundo

Procura-se ser livre, apesar das ideologias que oprimem as escolhas
Procura-se mudar, apesar das tradições que nos cerceiam feito bolhas

Procura-se sonhar, apesar dos medos insistirem em tampar os horizontes
Procura-se ser amigo, apesar dos interesses apodrecerem nossas pontes

Procura-se perdoar, apesar dos ressentimentos ressuscitarem de repente
Procura-se ser coerente, apesar das contradições que enlouquecem a gente

Procura-se cooperar, apesar das competições nos tornarem calculistas demais
Procura-se ser humano, apesar das violências nos igualarem aos piores animais

Procura-se ser herói, apesar dos incentivos que poderão nos abandonar
Procura-se escrever, apesar das palavras que não ousam se movimentar

Procura-se enxergar, apesar das maldades que escurecem nosso amanhecer
Procura-se ser poeta, apesar das inspirações que desperdiçamos sem saber

(Pablo Robles - POETA DO SOCIAL)

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Militarizando o desserviço ao Haiti

MILITARIZANDO O DESSERVIÇO AO HAITI

Meu grito, nunca calado, hoje, embalado pelo novo ano e refeito de alguns hiatos pessoais, volta a esgoelar-se, mais sedento de paz e sobretudo mais cônscio de que, enquanto houver injustiças, vozes não poderão dormir, para denunciar o silêncio da omissão... seja ela real, virtual, mundial, local e - a propósito - haitiana.

Lula anunciou, no evento do Fórum Social Mundial ocorrido recentemente em Porto Alegre, que irá ao Haiti no final de fevereiro. Propôs inclusive um ano de solidariedade a este país. O mês de janeiro, enfim, derramou-se em choros de dor, lágrimas de luta, gestos de fraternidade, explosões de compaixão.

Para a mídia (convencional), o assunto Haiti praticamente saiu de pauta. Esta mídia parece ter cumprido seu objetivo ideológico: divulgar o caos para justificar medidas de ordem. E em matéria de botar ordem na casa - ou no mundo ocidental - o super Tio Sam foi convocado. No entanto, este império em declínio meteu os pés pelas mãos, pela enésima vez.

Imagine-se dentro de uma imensa casa, quando de repente um incêndio ameaça a vida de seus familiares e amigos mais caros. Você pede ajuda desesperada aos vizinhos, no entanto, em vez de trazerem prioritariamente uns 12 bombeiros, enviam-lhe de forma oportunista mais 12 litros de combustível. Os filhos e amigos dos amigos que sobreviveram jamais entenderam a loucura da "solução" indicada para o acidente.

Não vou lembrar o que todos já sabem. Nem é sadio ficar contabilizando sangue. Mas vou atentar para a reflexão de que, por trás do fatídico terremoto natural e involuntário que se abateu sobre o já historicamente abatido Haiti, um terremoto político e voluntário sacudiu - como tantas vezes o faz - o bom-senso do governo norte-americano.

Como o trecho abaixo noticia, o Tio Sam bateu a porta na cara (sinta-se coração) de seus sobrinhos enfermeiros. Em vez de curativos, as malas de primeiros-socorros enviadas ao pobre Haiti estavam pesadas de equipamentos bélicos, carregadas por 12.000 soldados ianques, que por lá tem chegado e "ocupado" novamente o país, à revelia oficial da ONU, da missão brasileira no Haiti e do senso humano de paz (e justiça).

E por que fazem isso? O último Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça (onde Lula recebeu, representado pelo Min. Celso Amorim, o prêmio - inédito nos 40 anos deste Fórum - de Estadista Global), foi marcado por um alerta revelador: a economia norte-americana registra recuperação estatística mas ainda padece de recessão humana. Ou seja, o desemprego por lá (na mansão do Tio Sam) continua feio, insolúvel. E as contas do novo orçamento deles bateram o déficit recorde de 1,5 trilhão de dólares (fico até tonto só em digitar esta cifra).

Vou arriscar um palpite. O seu também vale. Por que salvar um país como o Haiti em um mês se você pode salvá-lo a prestação, em doze meses, ou dozes anos, com doze vezes mil soldadinhos americanos ociosos para trabalhar e girar a engrenagem meio carcomida da economia (nada econômica) dos EUA. Eles globalizaram as empresas (civis ou não), espalhando pelo mundo multinacionais famintas e bases militares antipáticas. Enfraqueceram com suas doutrinas neoliberais o papel e a força dos Estados-Nação (os quais hoje tentam se ressuscitar no xadrez geopolítico da América Latina e dos outros tabuleiros do planeta), tudo em nome do lucro fácil, concentrado e sutil, sem leis, transparências e “burocracias”.

No entanto, quando surge uma nova oportunidade de faturarem (nos vários sentidos lícitos e ilícitos do termo, como é o caso daqueles espertinhos que estão traficando criancinhas órfãs), os EUA, acima do bem e do mal, contra tudo e todos, rasgam sem pudor a bíblia de Adam Smith que cultuam da boca para fora: burocratizam a ajuda humanitária, burocratizam a cooperação internacional, burocratizam a reconstrução emergencial do Haiti, e ainda ousam burocratizar nossa livre capacidade de se indignar – sejamos enfermeiros(as) ou não.

Grito Pacífico - "mudando o mundo com você"


Michael Moore: Vergonha dos democratas

Fonte brasileira: http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/michael-moore-vergonha-dos-democratas/ - 02/02/2010

Michael Moore: "Os Democratas envergonham-me"

Fonte original: Democracy Now, via Esquerda.Net - 31/01/2010

Amy Goodman: Hoje entrevistamos Michael Moore, um dos realizadores de cinema independente mais famosos do mundo. Nestes últimos vinte anos, Moore tem sido um dos realizadores mais provocadores, bem sucedidos e politicamente activos. Podemos destacar da sua cinematografia, entre outros, títulos como "Roger and me" (Roger e Eu), "Fahrenheit 9/11", "Bowling for Columbine" - que lhe granjeou o prémio da Academia - e "Capitalism: A Love Story" (Capitalismo: Uma História de Amor), o seu filme mais recente.

(...) Tive a oportunidade de o entrevistar... Comecei com uma pergunta sobre a situação no Haiti.

Michael Moore: O mais espantoso acerca "da resposta norte-americana" - conforme disse - foi a reacção individual, de cada norte-americano. Mobilizaram-se no próprio dia do terramoto, doaram com mensagens de telemóvel para a Cruz Vermelha, ofereceram-se como voluntários, queriam ajudar. As campanhas de recolha de donativos começaram nesse mesmo instante.

Quando se deu o terramoto eu estava em Miami. Testemunhei este esforço. Sobretudo por parte da comunidade haitiana e de outras comunidades do Sul da Flórida. Houve até o caso de um médico de Fort Lauderdale, proprietário de um avião, que não esperou por autorizações oficiais. Chegou ao aeroporto, saltou para o cockpit, foi ao Haiti, trouxe todos os feridos que podia - cerca de quinze pessoas - e levou-os para o hospital de Fort Lauderdale. Eu pensei então, "Meu Deus, porque é que não assistimos a isto todos os dias?"

Mas a resposta do governo, digamos, foi desajeitada, soou mais uma vez a "Somos demasiado poderosos para falhar". Que é o mesmo que dizer, "Somos demasiado poderosos para sermos bem sucedidos". Pelo menos foi assim que deram a entender.

Mas também lhe digo: de imediato, e em poucas horas, Barack Obama tentou organizar uma resposta, o que contrasta, e muito, com o que assistimos durante os mandatos de Bush, como no caso do Katrina e de outras tragédias do género. De tal modo que me recordo de me ter sentido bastante satisfeito com esta reacção.

Mas depois, no segundo e no terceiro dia, quando se percebeu que não estava a chegar ao Haiti qualquer ajuda significativa e que nessa altura era mais importante resolver a situação dos norte-americanos que lá estavam, na Embaixada, no Hotel Montana, etc. etc... Com certeza, é natural ocuparmo-nos primeiro dos nossos compatriotas, mas eu esperava que estivéssemos ali para ajudar toda a gente e que ninguém fosse considerado mais humano do que o seu semelhante.

Amy Goodman: Não sabia de um grupo de enfermeiras que queria ir - ou seria mais do que um grupo?

Michael Moore: Meu Deus... O Sindicato Nacional dos Enfermeiros. Esse é o episódio mais triste de todos. Espero que quem me esteja a ouvir, e a ver, reaja e faça pressão sobre a administração Bush. O Sindicato Nacional dos Enfermeiros...

Amy Goodman: ...A administração Obama?

Michael Moore: Sim, a de Obama. O que é que eu disse? A...

Amy Goodman: Administração Bush.

Michael Moore: Certo, certo. Já estamos a pressioná-los. Já não estão entre nós. Mas isso não era só freudiano, este é o meu estado de espírito. Porque eu não aceito a agradável diferença entre as administrações Bush e Obama, é ilusória. À primeira vista, se compararmos a actualidade com o que aconteceu nos últimos oito anos, tudo nos parece fantástico, mas na essência, na prática... Não lhe consigo dizer o quanto estou desiludido.

E o que sucedeu com o Sindicato Nacional dos Enfermeiros revela o empenho deste corpo de profissionais. Quantos estavam dispostos a partir imediatamente para o Haiti? Quase doze mil enfermeiros, note bem, doze mil enfermeiros deste país estão dispostos a seguir para o Haiti. E um enfermeiro poderia cuidar de muitas pessoas. Imagine então quantas pessoas poderíamos ajudar se pudéssemos enviar doze mil enfermeiros devidamente equipados. E esta oferta já foi feita há muitos, muitos dias, está a perceber?

Amy Goodman: A quem?

Michael Moore: À administração Obama, pela dirigente do sindicato. Ela entrou em contacto com o governo e foi ignorada, de início ninguém lhe respondeu. Mas lá acabaram por encaminhá-la para alguém que não tinha qualquer poder de decisão. Então, depois de tudo isto, ela contactou-me e disse-me "Você saberá, porventura, como poderemos chegar até ao presidente Obama?"Eu respondi, "É patético o facto de vocês serem forçados a ligar-me, quer dizer, vocês são o maior sindicato de enfermeiros. Tanto quanto sei asseguram a vice-presidência da AFL-CIO [Federação Americana do Trabalho - Congresso de Organizações Industriais], e mesmo assim não conseguem que a Casa Branca vos autorize o envio de doze mil enfermeiros para o Haiti? Não sei o que fazer por vocês... Não sei, vou ligar também".

O que é certo é que até hoje pouco mais foi feito. É angustiante. E é só um exemplo do que se passa. Na última semana você fez a cobertura deste estado de coisas quando lá esteve - falharam redondamente.