domingo, 4 de novembro de 2007

CONTO: Esperança do Dia


Acordei mais cedo do que deveria, porém mais disposto do que merecia. O sol ainda bocejava sem pressa, anunciando um novo dia com raios de luz eficientemente preguiçosos e gradativamente fecundos.

Ao abrir a varanda de meu apartamento para cumprimentar os primeiros clarões da manhã e ser retribuído com os sussurros refrescantes do vento, tive que desviar o caminho habitual para a cozinha a fim de desligar o meu som, cansado de tocar a noite toda sem audiência.

Meia hora depois, me despedia do lar em direção à parada de ônibus. Era uma segunda-feira e o trabalho me chamava para o despertar da rotina semanal. Costumo ficar lendo alguma coisa até meu ônibus chegar.

Para não cansar a vista nem forçar o cérebro, nessas ocasiões priorizo romances leves, fluidos e envolventes, mas nesse dia, ainda que estivesse atento o suficiente para folhear obras mais densas, reflexivas e eruditas, optei por ler algo diferente, encantadoramente vivo e real.

Durante quinze minutos, meus olhos e demais sentidos se deixaram hipnotizar por uma poesia feminina, atraente e misteriosa: uma mulher cujos versos corpóreos rimavam perfeitamente com a beleza de seu rosto, iluminado por olhos que pareciam oscilar em tons de arco-íris.

Quanto mais eu a contemplava, mais ela se exibia. Li, sonhei e reli em todos os ritmos e direções possíveis as páginas desse espetáculo literário, saboreando seus conteúdos com devotada sensibilidade.

Antes do relógio do meu celular indicar que já estava na hora do meu ônibus passar, precisava transformar aquele poema à distância no princípio de um romance consubstanciado por nós dois; capaz de me transportar para lugares e experiências bem mais prazerosas, imprevisíveis e marcantes.

Precisava decifrar o nome e sobretudo o telefone dela. Enquanto ela se recolhia no canto da parada para analisar vaidosamente se eu era digno das respostas, meu ônibus me puxou. Antes de seguir viagem para puxar outros passageiros, eu só consegui ouvir uma resposta: - Sou a Esperança do Dia.

2 comentários:

Margareth Bravo disse...

Olá Pablo!!!
Que bela driblada poética numa segunda-feira que tinha tudo para ser um dia qualquer e você a vestiu com lirismo e a tornou uma nobre segunda-feira, esse foi um verdadeiro golpe de mestre!!! parabéns querido!!!E muitas, muitas segundas nobres para você!!!

João disse...

Pablo,

Gostei do conto,está bem escrito a sua mensagem,com sensibilidade nas palavras e ideia,e é um prazer lê-lo amigo.

Nele as manhãs de muitos homens que saem de casa sós e carentes por um olhar poético em que a esperança de vida esteja num numero de telefone,reflectem-se.
A mulher amada é essa esperança de vida.

Abraço Pablo,
joao