terça-feira, 8 de janeiro de 2008

ESCRITO: Do Ócio à Utopia


A televisão não consegue prender minha atenção - leia-se aprisionar minha consciência. O computador já esgotou sua cota regular de influência - essa tecnologia já me consumiu trinta horas durante a semana. O mundo lá fora não parece tão convidativo – minha preguiça física temporariamente se faz hegemônica. Meus filmes perderam seu poder de sedução – o estoque disponível de DVDs já foi demasiadamente digerido.

Outras pessoas estão fora do meu alcance tangível e não me sinto disposto a remediar tal distância através do telefone. Beber? Fumar? Esses verbos não se aplicam ao meu caso, pois nunca bebo sozinho em casa e jamais fumaria em lugar nenhum. Também não vou comer nem dormir. Quem come para passar o tempo só pode ser um compulsivo obeso e quem dorme por qualquer motivo deveria se enterrar logo no caixão para não mais acordar. Enfim, o que fazer nesta tarde de domingo que não seja tão habitual?

Escapando ao chamado lugar-comum, sem me deixar abater pela brisa cinzenta da hesitação nem ser capturado pelas garras traiçoeiras da inércia, rapidamente me vejo debruçado sobre a superfície branca, virgem e difusa de alguns papéis, convocados para uma inesperada e desafiadora missão: saciar a angústia precoce e volúvel de um jovem que decidiu intitular-se, pelo menos junto aos seus botões, como futuro escritor.

Escritor de quê? De qualquer coisa que possa agregar sentido a mim, às pessoas e ao mundo. Em termos comerciais: de algo que agrade às editoras. Do ponto de vista literário: de algo que desperte prazer estético. No âmbito científico: de algo que promova acirrados debates acadêmicos. Com base numa visão megalomaníaca: de algo que ocupe as prateleiras dos livros mais vendidos. Ainda não tenho o direito de me atrever a planejar aquilo que escreverei. Por enquanto, só me resta especular o imponderável.

A tarefa não é fácil, pois embora eu gaste muito tempo lendo e de vez em quando alimente o desiderato de deixar alguma herança impressa que possa ser útil a alguém, a realidade da prática é bem diferente. Uma coisa é escrever, descompromissadamente, dez possíveis títulos de obras que um dia eu poderia dar forma, essência e vida. Outra coisa, bastante árdua e conseqüente, significa redigir efetivamente os conteúdos e capítulos destes pretensos materiais, sem perder de vista suas reais perspectivas de contribuição.

Mas como não é proibido projetar o futuro, ainda que o passado dele não revele nenhuma pista e o presente não passe de um esboço miniaturizado e imprevisível dos desígnios vindouros, me permito derramar neste texto, com humilde ousadia, a intenção de algum dia fazer nascer, a partir de meu próprio punho e obstinação, um ou mais livros. Que o blog que hospeda este pequeno texto seja o arauto desta utopia. Ainda que seu eventual horizonte brilhe além de minha visão, o importante é acreditar que ele pode existir.

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