quarta-feira, 29 de julho de 2009

O voo grandioso de Patativa

Segue fichamento de um interessante texto sobre o grande poeta Patativa, elaborado como exercício da disciplina de Produção e Compreensão Textual de minha graduação em Ciências Sociais, ministrada pelas professoras Tércia Montenegro e Lavínia.

Percebam os impulsos sociais embutidos na veia poética de Patativa do Assaré!

FICHAMENTO DE TEXTO SOBRE PATATIVA DO ASSARÉ

TEXTO-BASE: JUNIOR, Gonçalo. O vôo de Patativa do Assaré. Revista Pesquisa Fapesp. São Paulo, edição 158, abril 2009. Disponível em: www.revistapesquisafapesp.br

Nascido no município cearense de Assaré, Antônio Gonçalves da Silva ganhou o pseudônimo de Patativa aos 20 anos “porque sua poesia era comparável à beleza do canto dessa ave”. Perdeu o pai cedo e teve que trabalhar como agricultor aos 8 anos, só podendo freqüentar a escola aos 12, alfabetizando-se em poucos meses.

Foi poeta popular, compositor, cantor e improvisador. É considerado o maior poeta nordestino do século XX. Possuía prodigiosa memória poética e sua obra é banhada de sabedoria popular. “Não por acaso, recebeu diversas premiações, títulos e homenagens – foi cinco vezes nomeado doutor honoris causa”.

Tornou-se conhecido com o poema A triste partida, composto em 1958 e gravado em 1964 por Luiz Gonzaga. A letra aborda a migração causada pela seca e “se tornou um marco da música popular brasileira” por conter ousadias como a presença de 19 estrofes e ter sido gravada em múltiplos canais, “como se fosse ao vivo”.

“Essa gravação inspirou Cláudio Henrique Sales de Andrade a defender na USP o doutorado Aspectos e impasses da poesia de Patativa do Assaré. Cursou Letras nessa universidade e também fez mestrado sobre o poeta. Ele trabalhou na cidade do poeta e freqüentou sua casa por dois anos.

O doutorado empreendeu quatro passos: “mapeamento formal de sua obra”; descrição da “diferença de sua poesia para com a tradição que o formou”; identificação das vertentes culta e popular; e estudo da “dialética entre modernização e tradicionalismo”. Andrade “detectou inúmeros erros em todas as edições das obras do poeta”.

O estudioso justifica a relevância e originalidade de Patativa: “ele mantém viva e atualizada uma poesia de raízes populares, nutrida no regime da oralidade, mas amplifica os limites temáticos e formais dessas tradições ao acrescentar um forte componente autoral e um refinado lirismo, além de uma atitude reflexiva pouco usual”.

“Crítico das formas de dominação paternalistas”, Patativa desmistifica a idéia de progresso e suas contradições, sendo “ao mesmo tempo capaz de resgatar e divulgar a poesia e o humanismo inerentes aos modos de vida arcaico e tradicional”. Essa perspectiva, segundo Andrade, ilustra “a riqueza do ponto de vista do poeta”.

Patativa não deve ser considerado um autor de cordel, pois só produziu três poemas nesse gênero. “Sua obra se divide em três vertentes: lírica, narrativa e reflexiva”. Sua poesia expressa dois registros lingüísticos: o português popular e a norma culta.

O poeta “foi um atualizador do esquema dualista da peleja poética dos desafios de cantadores (...), criando vários poemas em que dá voz a dois pontos de vista distintos e em oposição”. Também foi um grande sonetista e musicou alguns poemas.

Andrade selecionou e estudou três sonetos do poeta com o objetivo de “apreender a singularidade da produção de Patativa, compreender a natureza e delimitar os contornos de sua poética”. Com isso, o estudioso verificou que a riqueza temática, simbólica e estilística de sua poesia vai muito além do status de poesia sertaneja.

Patativa, “além de uma formação fundamentada nas poéticas da oralidade”, interessou-se por poetas cultos como Camões, Castro Alves, Casimiro de Abreu, Olavo Bilac e Gregório de Matos, demonstrando particular afinidade com este último, devido seu espírito de sátira e o uso da métrica decassílaba, típica dos repentistas.

Sua poesia contém ainda traços de lirismo e “uma abertura para temas universais e mais abstratos” (a exemplo dos direitos humanos). Ademais, chegou a elaborar “uma poesia mais reflexiva, não narrativa, em que o poeta toma distância e enuncia avaliações e juízos críticos sobre as questões sociais”.

Andrade, por fim, revela que “a obra de Patativa ainda espera por reconhecimento dos grandes centros do Sudeste brasileiro”. Mas tal interesse vem aumentando bastante.

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